Resumo
Um novo estudo mostra que alucinações auditivas em pessoas com esquizofrenia podem acontecer quando o cérebro não reconhece sua própria voz interior como algo gerado por ele mesmo. Normalmente, o cérebro prevê o som do discurso interior e reduz as respostas auditivas. Mas esse funcionamento não ocorre em quem ouve vozes.
Leituras de EEG mostraram que, ao invés de ter atividade auditiva reduzida, pessoas com alucinações recentes apresentaram respostas cerebrais mais fortes ao imaginar sons que correspondiam a sons externos. Essa descoberta é uma das melhores evidências até agora para a teoria do discurso interior mal atribuído e pode abrir caminho para biomarcadores precoces de psicose.
Fatos principais:
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Erro de Previsão do Cérebro: O córtex auditivo não consegue suprimir o discurso interior, fazendo com que o cérebro confunda com sons externos.
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Evidências do EEG: Participantes com alucinações recentes mostraram respostas cerebrais inversas, indicando mecanismos de previsão desregulados.
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Potencial Clínico: Os resultados podem levar à descoberta de biomarcadores biológicos para identificar ou prever psicose antes do seu início.
Um estudo realizado por psicólogos de uma universidade australiana trouxe novas evidências sobre alucinações auditivas em pessoas com esquizofrenia, ligando isso a uma dificuldade do cérebro em reconhecer sua própria voz interior. Os pesquisadores dizem que essa descoberta pode ser um passo importante na busca por indicadores biológicos que ajudem a identificar a esquizofrenia.
Atualmente, não existem testes de sangue, exames de imagem ou biomarcadores que possam dizer com clareza se alguém tem esquizofrenia. O professor Thomas Whitford, da Escola de Psicologia da universidade, estuda há algum tempo a importância do discurso interior tanto em pessoas saudáveis como em quem tem transtornos do espectro esquizofrênico.
“Discurso interior é a voz na sua cabeça que narra silenciosamente seus pensamentos – seja o que você está fazendo, planejando ou percebendo”, explica. “A maioria das pessoas passa por isso sem perceber, mas tem quem não tenha essa experiência.”
A pesquisa indica que, quando falamos, mesmo que seja só em nossa mente, a parte do cérebro que processa sons do mundo externo diminui a atividade. Isso acontece porque o cérebro antecipa o som da sua própria voz. No entanto, para aqueles que ouvem vozes, essa previsão não funciona direito, e o cérebro age como se a voz fosse de alguém de fora.
Análise das Ondas Cerebrais
O professor Whitford confirma uma teoria que pesquisadores de saúde mental discutem há décadas: as alucinações auditivas em esquizofrênicos podem ser causadas por um erro em interpretar o próprio discurso interno como algo externo. Esse conceito existe há mais de 50 anos, mas é difícil de testar porque o discurso interior é algo privado.
Um método utilizado foi o EEG, que registra a atividade elétrica do cérebro. Mesmo sem ouvir o discurso interior, o cérebro reage de qualquer forma. Em pessoas saudáveis, usar o discurso interior diminui a atividade cerebral, assim como quando falamos em voz alta. Porém, em pessoas que ouvem vozes, essa redução não ocorre. Na verdade, eles apresentam uma reação ainda mais intensa ao discurso interno, como se estivesse vindo de outra pessoa. Isso pode explicar porque essas vozes parecem tão reais.
Escolhas Sonoras
Os pesquisadores dividiram os participantes em três grupos. O primeiro tinha 55 pessoas com transtornos do espectro esquizofrênico que ouviram vozes na última semana. O segundo grupo continha 44 pessoas com esquizofrenia, mas sem histórico recente de alucinações. O terceiro era um grupo controle, com 43 pessoas saudáveis sem histórico da doença.
Todos os participantes foram conectados a um aparelho de EEG para medir as ondas cerebrais enquanto ouviam sons por fones de ouvido. Eles deveriam imaginar dizer “bah” ou “bih” exatamente no momento em que ouviam esses sons.
Os participantes não sabiam qual som iriam ouvir nos fones. Nos participantes saudáveis, quando o som ouvido correspondia ao que estavam imaginando, o EEG mostrava uma redução da atividade no córtex auditivo, indicando que o cérebro estava prevendo o som e suavizando a resposta, como acontece ao falarmos em voz alta.
Entretanto, para o grupo que tinha alucinações auditivas recentes, os resultados foram opostos. Nesse caso, ao invés de uma redução esperada da atividade cerebral, o EEG mostrava uma resposta aumentada.
“Os cérebros deles reagiam mais intensamente ao discurso interno que combinava com o som externo, o que é o oposto do que encontramos em participantes saudáveis”, diz o professor Whitford. Essa inversão na resposta indica que os mecanismos de previsão do cérebro podem estar desregulados em quem está atualmente vivenciando alucinações auditivas, fazendo com que sua própria voz interior seja confundida com algo de fora.
Participantes do segundo grupo – aqueles que não tiveram alucinações recentemente – mostraram um padrão intermediário entre os saudáveis e aqueles que estavam ouvindo vozes.
O Que Isso Significa
Os pesquisadores afirmam que essa é a confirmação mais forte até agora de que os cérebros de pessoas com esquizofrenia podem estar percepcionando o discurso imaginado como se fosse externo.
“Era uma teoria plausível – de que as pessoas estavam ouvindo seus próprios pensamentos em voz alta – mas essa nova abordagem nos deu o teste mais direto disso até agora”, conclui o professor Whitford.
O próximo passo dos pesquisadores é entender se essa medida pode prever quem pode passar para um estado de psicose, com a possibilidade de identificar pessoas com alto risco de desenvolver psicose, permitindo intervenções precoces.
“Esse tipo de medida tem um grande potencial para se tornar um biomarcador para o desenvolvimento de psicose”, diz o professor. “Entender as causas biológicas dos sintomas da esquizofrenia é um passo necessário para que possamos desenvolver novos tratamentos eficazes.”
Perguntas Frequentes
Q: O que causa as pessoas com esquizofrenia a ouvirem vozes?
A: O estudo sugere que isso ocorre quando o cérebro confunde seu próprio discurso interior com uma fala externa devido a uma falha na previsão dos sons gerados pelo próprio indivíduo.
Q: Como os pesquisadores testaram as alucinações auditivas na esquizofrenia?
A: Usando EEG, eles compararam a atividade cerebral de pessoas que imaginavam sons com e sem esquizofrenia, revelando efeitos de supressão inversa em quem ouve vozes.
Q: Por que isso é importante para o tratamento da esquizofrenia e das alucinações?
A: Compreender a origem biológica das alucinações pode levar a ferramentas diagnósticas precoces e intervenções mais direcionadas para a psicose.
Esses achados podem trazer um novo olhar sobre o tratamento e a compreensão da esquizofrenia, buscando maneiras de ajudar os que enfrentam essas dificuldades diárias.
