Testes Medievais: A Brutal Forma de Julgamento

    No mundo atual, as decisões sobre a culpa de um criminoso são feitas por juízes e jurados. No entanto, na Idade Média, outra prática dominava: os testes medievais, também conhecidos como “juízos de Deus”. Durante esses testes, o acusado precisava provar sua inocência através de métodos dolorosos e muitas vezes mortais.

    Esses julgamentos transferiam o destino dos acusados para as mãos de Deus. Os suspeitos tinham que realizar tarefas arriscadas, como segurar ferro em brasa ou ser jogados na água. Caso fossem inocentes, acreditava-se que Deus interviria e os salvaria. Se fossem culpados, enfrentariam uma morte horrível.

    Inicialmente, os sacerdotes eram parte desse processo, abençoando os objetos usados nos testes e decidindo se houve intervenção divina. Porém, a partir do século 13, um decreto papal proibiu a participação dos sacerdotes, já que as provas eram vistas como um teste à vontade do Criador.

    Com o tempo, esses testes foram desaparecendo. Alguns, como os “testes de natação” durante caças às bruxas na Europa e o “júri de combate”, só foram banidos na Inglaterra no século 19. Hoje, esses julgamentos são lembrados como uma parte perturbadora da ideia de justiça de nossos antepassados.

    O Teste do Fogo

    Um dos métodos mais comuns de julgamento era o teste do fogo. Esse teste tinha várias versões, mas a mais documentada exigia que o acusado segurasse uma barra de ferro em brasa e caminhasse por nove pés. O ferimento era analisado nos três dias seguintes. Se a queimadura cicatrizasse bem, o réu era considerado inocente; se infeccionasse, era considerado culpado.

    Um caso notório desse tipo foi o de Pedro Bartolomeu, um místico francês que, em 1099, se ofereceu para passar pelo teste para provar que havia encontrado a Lança Sagrada, que supostamente feriu Jesus na cruz. Ele teria que atravessar entre duas pilhas de lenha em chamas segurando a lança. Se ele e a relíquia saíssem ilesos, isso provaria sua veracidade. Infelizmente, Pedro morreu dias depois devido aos ferimentos.

    Outro teste de fogo envolvia derramar metal fervente sobre o peito do acusado ou fazê-lo ficar em pé sobre uma lâmina de arado aquecida até brilhar. Dizem que Emma da Normandia, mãe do Rei Eduardo, passou por esse tipo de teste ao ser acusada de ter um caso com um bispo. Ao caminhar sobre arados em chamas, ela não sentiu dor, o que confirmava sua castidade, segundo a lenda.

    O Julgamento pela Água e os Caças às Bruxas

    Os testes pela água são bem conhecidos, especialmente por sua utilização durante as caças às bruxas. Nesse método, o acusado era amarrado e jogado em um corpo d’água. Se afundasse, era considerado inocente e retirado antes de se afogar. Se flutuasse, era visto como culpado.

    Esses julgamentos têm raízes antigas, presentes até no Código de Ur-Nammu, um dos mais antigos conjuntos de leis, que data de 2100 a.C. na Mesopotâmia. Esse código estipulava que, se um homem fosse acusado de feitiçaria e provasse sua inocência no teste à água, seu acusador deveria pagar uma multa.

    No século 16, o rei Jaime VI da Escócia comentou sobre esse teste, afirmando que Deus havia determinado que a água não acolhesse aqueles que rejeitaram seu batismo.

    Outros métodos de julgamento relacionados à água incluíam forçar o acusado a colocar as mãos em um caldeirão com água ou óleo fervente para pegar um objeto no fundo. Em outra versão, tanto o acusado quanto seu acusador deveriam colocar as mãos no caldeirão; quem se queimasse menos “ganhava” o caso.

    Julgamentos Inusitados: Queijo e Sangue de Cadáveres

    Um dos testes mais estranhos era o “teste de ingestão”. Nele, um sacerdote abençoava pão e queijo. Se o acusado conseguisse comer normalmente, era considerado inocente. Se tivesse dificuldade ou engasgasse, seria declarado culpado.

    Outro julgamento peculiares era o teste de “sangramento”. No caso de assassinato, o suspeito era levado até o corpo da vítima. Se a ferida fatal começasse a sangrar novamente, o acusado era preso como o assassino. Um exemplo é o de Hans Spiess, um soldado suíço, que foi acusado de matar sua esposa. Ao ser levado até seu corpo, este começou a sangrar, e Hans foi condenado e executado.

    Além disso, Shakespeare mencionou o teste de sangramento na peça “Ricardo III”. Durante o funeral do Rei Henrique VI, a nora dele confronta o assassino, dizendo que as feridas de Henrique sangravam novamente.

    Shakespeare também faz referência ao teste de combate, que foi introduzido pelos normandos em 1066 e continuou até o século 19. Nesse caso, acreditava-se que Deus escolheria quem deveria vencer, permitindo uma resolução de disputas através da força.

    O Fim dos Julgamentos Medievais

    No século 19, a participação de sacerdotes nos testes de ordeis já estava banida havia séculos. Em 1215, o Papa Inocêncio III declarou que nenhum clérigo poderia participar de julgamentos envolvendo derramamento de sangue ou abençoar rituais de purificação que envolvessem água fervente ou ferro em brasa.

    O envolvimento dos clérigos era visto como uma maneira de forçar Deus a agir. Ao mesmo tempo, os julgamentos por júri começaram a se tornar mais comuns. Em 1219, o Rei Henrique III introduziu júris em casos de crimes graves, diminuindo assim a necessidade dos testes medievais.

    Com o tempo, os julgamentos por ordem foram abandonados completamente. Hoje, eles são lembrados como práticas bárbaras que muitas vezes levaram à prisão e morte de inocentes.


    Esses horrendos métodos medievais refletem uma era de incerteza e brutalidade. Apesar de terem ficado para trás, eles nos lembram da importância de buscar uma justiça mais humana e justa.

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