A saúde mental das mulheres pode ser significativamente afetada durante e após a gravidez. Para entender melhor esse fenômeno, cientistas de diversos países estão investigando as doenças psiquiátricas que podem surgir nesse período. Especialistas de uma conferência internacional propuseram que a psicose pós-parto seja reconhecida como uma categoria independente de doença mental. Essa mudança visa facilitar diagnósticos mais rápidos e tratamento eficaz, com o objetivo de proteger a vida de mães e bebês.
A psicose pós-parto é uma condição grave, afetando cerca de 2,6 a cada mil mulheres que dão à luz. Os sintomas incluem episódios de mania, depressão grave com características psicóticas, pensamentos desorganizados, agitação, irritabilidade, alucinações, paranoia e insônia. Sem tratamento, a situação pode levar a consequências extremas, como suicídio ou até o homicídio do bebê, tornando essa condição uma emergência psiquiátrica que muitas vezes requer hospitalização.
Atualmente, a psicose pós-parto não é reconhecida como um diagnóstico próprio em dois dos principais guias médicos, o DSM-5 e a Classificação Internacional de Doenças. Esses documentos apenas mencionam o “início periparto”, o que não cobre casos que aparecem semanas ou meses após o parto. Segundo os especialistas, isso dificulta o diagnóstico e o acesso ao tratamento necessário. Jennifer Payne, uma psiquiatra reprodutiva da Universidade da Virgínia, destaca que o reconhecimento da psicose pós-parto como uma condição distinta poderia melhorar as intervenções clínicas e garantir um tratamento baseado em evidências.
Estudos mostram que muitas mulheres respondem positivamente aos tratamentos disponíveis, e quem desenvolve psicose pós-parto tem cerca de 50% de chance de eventualmente ter transtorno bipolar. Por outro lado, gestantes com um histórico de transtorno bipolar correm um risco elevado de experimentar essa psicose após o parto.
A ausência de uma classificação diagnóstica específica pode resultar em subdiagnósticos ou diagnósticos tardios, como explica a psiquiatra Carolina Guedes. Durante os primeiros estágios, sintomas como insônia severa e mudanças bruscas de comportamento podem ser erroneamente interpretados como reações emocionais normais do pós-parto, atrasando o cuidado adequado.
Novas pesquisas, como um estudo realizado com mais de 1,6 milhão de mulheres na Suécia, indicam que a condição pode ter um componente genético. Mulheres cujas irmãs sofreram de psicose pós-parto têm mais de 10 vezes mais chances de desenvolver a condição. O risco se eleva a 14 vezes para aquelas com um histórico familiar de transtorno bipolar.
Para Veerle Bergink, diretora do Centro de Saúde Mental da Mulher do Mount Sinai, a conscientização sobre essa condição é crucial. Ela ressalta que é vital que mulheres em idade fértil e seus médicos estejam cientes dos sintomas, da gravidade da psicose pós-parto e do risco familiar, de modo a garantir um diagnóstico e tratamento precoces.
Com a necessidade crescente de suporte psicológico, um novo programa chamado Aurora foi implementado no Sistema Único de Saúde (SUS) para ajudar mães durante o puerpério. O projeto oferece suporte 24 horas, combinando telemonitoramento, informações educativas e uma equipe multidisciplinar, incluindo psicólogos, voltada para atender às necessidades de mães e recém-nascidos, especialmente em regiões com população vulnerável.
O programa acompanha as mães nos primeiros 60 dias após o parto e já está disponível na rede pública. Atualmente, 192 mulheres estão recebendo esse atendimento, com uma equipe de enfermagem, nutrição e psicologia tendo um papel fundamental. O objetivo é acolher as mães, ajudando a lidar com a insegurança e a sobrecarga emocional, prevenindo condições como o baby blues e a depressão pós-parto.
Tatiana Barbosa, psicóloga supervisora do Programa Aurora, destaca a importância desse acompanhamento contínuo, que permite às mães expressarem suas preocupações em um ambiente acolhedor e sem julgamentos. Isso ajuda a identificar rapidamente sinais de problemas emocionais e possibilita intervenções eficazes.
A iniciativa Aurora traz um novo suporte para as mães, que após o parto frequentemente enfrentam ansiedades e inseguranças que não são percebidas. Com esse projeto, especialistas acreditam que é possível reduzir a ansiedade materna e facilitar a identificação precoce de quadros como o baby blues e a depressão pós-parto, oferecendo o apoio necessário após a alta do hospital, garantindo assim um cuidado mais integral às novas mães.
