Guillermo del Toro, cineasta conhecido por sua abordagem única e sensível em suas obras, lançou uma nova adaptação do clássico “Frankenstein” de Mary Shelley, disponível na Netflix. Del Toro é um grande admirador do romance de 1818, que ele considera essencial em sua formação artística. Nesta produção, Oscar Isaac interpreta Victor Frankenstein, um cientista obcecado, enquanto Jacob Elordi assume o papel da criatura.

    A história de “Frankenstein” é uma das mais adaptadas da literatura, com diversas interpretações ao longo dos anos. A versão de James Whale, de 1931, é uma das mais memoráveis, retratando a criatura como um monstro de pele verde e parafusos no pescoço. Outras adaptações, como a de Kenneth Branagh em 1994, buscaram uma fidelidade maior ao texto original.

    Del Toro, no entanto, deixa claro que sua versão não é uma transcrição fiel do romance. Ele realizou mudanças significativas, como a reinvenção da personagem Elizabeth, interpretada por Mia Goth, e a modificação do passado de Victor. Elementos como o amigo de Victor, Henry Clerval, e a serva Justine Moritz foram eliminados, mas a intenção de capturar a essência da obra permanece.

    O cineasta expressou que sua visão caracteriza “Frankenstein” mais como uma narrativa sobre o espírito humano do que sobre ciência descontrolada. Para ele, o foco está na importância do perdão, compreensão e na necessidade de escutar os outros.

    A nova adaptação faz alterações relevantes, como a transformação da relação entre Victor e seu pai. Em vez de ser uma figura de apoio, o pai é retratado como um médico abusivo, o que muda a abordagem dos temas centrais da história, como a busca por poder e a dinâmica familiar.

    Elizabeth, na versão de Del Toro, é apresentada de forma mais independente, destacando sua paixão pela entomologia. Em vez de ser apenas uma noiva passiva, ela se torna uma figura ativa que questiona Victor sobre suas invenções e suas mentiras.

    Outra mudança significativa é a relação entre Elizabeth e a criatura. Enquanto na obra original há um encontro trágico, na adaptação eles desenvolvem uma conexão fundada na empatia. Elizabeth se torna a única a demonstrar compreensão pela criatura, que expressa questões de identidade e aceitação. Essa associação, embora intensa, não é romantizada, mantendo um tom mais de amizade e solidariedade.

    Apesar das críticas à diminuição da crítica social que aparece na obra de Shelley, a adaptação aborda temas como violência e opressão de forma mais sutil, ligando-os a questões contemporâneas como militarismo e capitalismo. Essa mudança de enfoque fez com que a história perdesse algumas das camadas mais profundas sobre o tratamento de figuras marginalizadas, especialmente mulheres.

    Del Toro também humaniza a criatura, permitindo um desenvolvimento mais emocional e aprofundando os diálogos entre os personagens. Essa aproximação cria uma relação de empatia e compaixão, afastando-se da pura representação do horror.

    Um dos aspectos mais interessantes da adaptação é a inclusão da interação da criatura com a família De Lacey, um momento emblemático do livro que destaca o valor da amizade e da aceitação.

    Comparado a outras versões cinematográficas, o filme de Del Toro se destaca por sua fidelidade à complexidade do texto de Shelley. Ele apresenta uma narrativa mais rica e semelhante à estrutura do livro, refletindo questões existenciais relevantes. Embora não seja um filme de terror no sentido tradicional, tem uma aura gótica que revela uma busca por significados mais profundos.

    Diante de todas essas transformações, a nova adaptação de “Frankenstein” propõe um olhar fresco sobre uma obra clássica, ao mesmo tempo que honra a figura de Mary Shelley e sua análise perspicaz sobre a condição humana.

    Share.