Resumo:

    Pesquisadores brasileiros criaram um biossensor portátil que pode detectar o BDNF, uma proteína relacionada a problemas de saúde mental como depressão, esquizofrenia e transtorno bipolar. O dispositivo, que é flexível e barato, analisa uma gota de saliva em menos de três minutos, oferecendo uma ferramenta de diagnóstico rápida, acessível e não invasiva.

    Os baixos níveis de BDNF estão associados à depressão e ao declínio cognitivo. O teste pode ajudar médicos a identificar e monitorar esses transtornos mais cedo. Com um custo estimado de apenas R$ 12,00 por unidade, o biossensor pode mudar a forma como a saúde mental é avaliada, principalmente em locais com poucos recursos.

    Fatos importantes:

    • Resultados rápidos: O biossensor de saliva mede níveis de BDNF em menos de três minutos.
    • Inovação acessível: Cada unidade custa cerca de R$ 12,00, facilitando o uso em larga escala.
    • Relevância clínica: Níveis baixos de BDNF estão ligados à depressão, enquanto aumentos podem acompanhar a recuperação.

    Pesquisadores do Brasil desenvolveram um biossensor portátil e de baixo custo que pode identificar rapidamente alterações em uma proteína associada a transtornos psiquiátricos, como a depressão. Quando for lançado comercialmente, esse dispositivo pode ajudar na detecção precoce de essas condições, fundamental para o tratamento e acompanhamento dos pacientes.

    O biossensor é resultado de uma parceria entre a Universidade de São Paulo (USP) e a Embrapa Instrumentação, uma unidade da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa). O dispositivo consiste em uma tira flexível com eletrodos, que, quando ligada a um analisador portátil, avalia gotas de saliva.

    Em menos de três minutos, o biossensor entrega a concentração de BDNF, fator neurotrófico derivado do cérebro, essencial para a saúde dos neurônios e para funções cognitivas, como aprendizagem e memória.

    A pesquisa mostra que o dispositivo pode medir concentrações de BDNF extremamente baixas, variando de 10⁻²⁰ a 10⁻¹⁰ gramas por mililitro de saliva, detectando até as quantidades mínimas, de 1.0 × 10⁻²⁰ gramas por mililitro.

    O custo estimado do biossensor é de cerca de R$ 12,00 por unidade, o que permite armazenamento a longo prazo. O próximo passo dos pesquisadores é buscar a patente.

    “Poucos sensores realizam esse tipo de análise, e o nosso obteve os melhores resultados. Ele detectou uma ampla gama de concentrações, o que é ótimo do ponto de vista clínico. Quando os níveis de proteína são muito baixos, isso pode ser um sinal de alerta para doenças e transtornos psiquiátricos”, explica Paulo Augusto Raymundo Pereira, pesquisador do Instituto de Física de São Carlos (IFSC-USP).

    Pereira tem experiência em química e biotecnologia e já trabalhou com sensores flexíveis e biossensores eletroquímicos. No ano passado, ele co-autorizou um artigo sobre um sensor portátil para autoavaliação de urina, que detecta marcadores de doenças como gota e Parkinson.

    Vínculo com distúrbios:

    Estudos mostram que níveis baixos de BDNF estão envolvidos em alguns transtornos neurológicos e psiquiátricos, que podem levar a um declínio cognitivo. A depressão, por exemplo, é um dos transtornos relacionados. O efeito da proteína pode ser restaurado com o uso de antidepressivos. Indivíduos saudáveis têm níveis de BDNF acima de 20 nanogramas por mililitro (ng/mL), enquanto pacientes com depressão maior apresentam níveis abaixo de 10 ou 12 ng/mL.

    De acordo com dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), mais de 1 bilhão de pessoas vive com transtornos mentais, sendo a ansiedade e a depressão as condições mais comuns. Relatórios da OMS, como o “Mental Health Atlas 2024”, indicam que esses problemas têm aumentado em todo o mundo, afetando pessoas de todas as idades e classes sociais.

    Entre 2022 e 2024, as faltas no trabalho devido a problemas de saúde mental no Brasil aumentaram 134%. Segundo o Observatório de Saúde e Segurança no Trabalho, essas ausências passaram de 201 mil para 472 mil, sendo causadas por episódios de depressão, ansiedade e depressão recorrente.

    Pereira acrescenta que o aumento dos casos de distúrbios mentais e o consequente aumento no uso de medicamentos, especialmente após a pandemia de COVID-19, motivaram a equipe a desenvolver soluções. O pesquisador conta com o apoio de bolsas da FAPESP.

    O dispositivo:

    Os pesquisadores criaram uma tira de sensor flexível impressa em um filme de poliéster com três eletrodos: um eletrodo de trabalho funcionalizado, um eletrodo auxiliar de carbono puro e um eletrodo de referência de prata.

    O eletrodo de trabalho foi modificado com esferas de carbono e recebeu uma camada de dois compostos químicos – polietilenimina e glutaraldeído – para aumentar a sensibilidade e atuar como uma matriz para imobilizar o anticorpo específico de captura do BDNF. Uma camada reativa de etanolamina foi adicionada para evitar outras interações.

    A detecção do BDNF é baseada na formação de complexos imunoanticorpo-antígeno, que aumentam a resistência à transferência de elétrons na superfície do sensor. Esse crescimento é capturado pela espectroscopia de impedância eletroquímica, que estuda processos nas interfaces entre um eletrodo e uma solução.

    Os resultados podem ser exibidos em tempo real em um dispositivo móvel (smartphone) via comunicação sem fio (Bluetooth). As técnicas atuais para analisar os níveis de BDNF incluem ensaios de imunoadsorção enzimática (ELISA), quimioluminescência, fluorescência e cromatografia líquida de alta performance (HPLC), todas exigindo tempo, grandes volumes de amostras e laboratórios especializados.

    “Ocorre uma evolução rumo à medicina personalizada, em que os tratamentos são cada vez mais feitos para cada indivíduo. O biossensor, nesse caso, pode ser otimizado para diferentes perfis”, comenta o pesquisador.

    Conclusão:

    A equipe de pesquisadores é composta por Nathalia Gomes, Marcelo Luiz Calegaro, Luiz Henrique Capparelli Mattoso, Sérgio Antônio Spinola Machado e Osvaldo de Oliveira Junior. O projeto é uma contribuição significativa para a detecção precoce de problemas de saúde mental, oferecendo uma ferramenta prática e acessível.

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