A Doença de Alzheimer e a Nova Descoberta sobre Plaquetas
Por muitos anos, pesquisadores entenderam que a doença de Alzheimer é marcada por placas pegajosas e proteínas emaranhadas no cérebro. Nos últimos tempos, ficou claro que os vasos sanguíneos do cérebro também têm um papel importante no desenvolvimento da doença. No entanto, mesmo com todo esse conhecimento, ainda não existem tratamentos totalmente eficazes. O principal desafio está na falta de clareza sobre a sequência de eventos biológicos que leva à perda das células cerebrais.
A Interação Prejudicial Entre Amiloide Beta e Proteínas do Sangue
Recentes estudos revelaram uma relação danosa entre duas moléculas importantes: a amiloide beta (Aβ), conhecida por formar placas, e a fibrinogênio, uma proteína do sangue que ajuda na coagulação. Quando a Aβ se liga ao fibrinogênio, ocorre a formação de coágulos estranhos que não se desfazem facilmente. Esses coágulos teimosos estão associados à inflamação e danos nos vasos sanguíneos. Até mesmo quantidades pequenas dessa combinação podem desencadear os primeiros sinais de Alzheimer, como a perda de sinapses, inchaço no cérebro e vazamentos na barreira hematoencefálica. Essa descoberta reforça que problemas nos vasos sanguíneos estão diretamente ligados à destruição neural e destaca um novo alvo promissor para tratamento: o complexo Aβ/fibrinogênio.
Erin Norris, professora de pesquisa no laboratório de Sidney Strickland, explica que, isoladamente, a Aβ ou o fibrinogênio precisam de maiores quantidades para causar danos significativos. Porém, quando essas duas moléculas se unem, até pequenas quantidades de cada uma podem causar sérios problemas. Há um efeito sinérgico entre elas.
Investigando uma Hipótese Antiga
O laboratório de Neurobiologia e Genética de Patricia e John Rosenwald, sob a liderança de Strickland, pesquisa a ligação entre Aβ e fibrinogênio há quase duas décadas. Estudos anteriores já mostraram que a Aβ se liga ao fibrinogênio e ligaram essa interação à progressão da doença de Alzheimer. Naquela época, a ideia de que problemas nos vasos sanguíneos poderiam influenciar a doença era polêmica. Norris menciona que foi somente com várias descobertas na área que as pessoas começaram a compreender a importância do sistema vascular na patogênese da doença.
Identificar esse complexo foi só o começo da investigação. Os cientistas queriam entender quão grande era o dano que ele poderia causar por conta própria. Eles recriaram concentrações baixas do complexo Aβ/fibrinogênio em laboratório e aplicaram em lâminas finas de tecido cerebral de camundongos, além de utilizar camundongos vivos para observar os efeitos em condições controladas.
Elisa Nicoloso Simões-Pires, pesquisadora associada, comenta que o objetivo era demonstrar claramente o dano, analisando como as terminações pré e pós-sinápticas eram afetadas. Nos testes, ficou claro que enquanto Aβ e fibrinogênio sozinhos causavam pouco estrago, até pequenas quantidades do complexo combinado levavam a grandes problemas. Isso resultou em dano às sinapses, aumento da inflamação e desestruturação da barreira hematoencefálica – características típicas da doença de Alzheimer. Ao utilizar anticorpos que impediam a Aβ de se ligar ao fibrinogênio, os efeitos nocivos foram significativamente reduzidos.
Simões-Pires explica que esse complexo realmente provoca vazamentos na barreira hematoencefálica, o que não aconteceria se as proteínas fossem isoladas. Quando a barreira é rompida, proteínas do sangue podem entrar no cérebro, causando ainda mais danos.
Dicas Sobre o Alzheimer Precoce e Possíveis Tratamentos
Um dos pontos fortes do estudo é que ele usou tanto tecido cerebral isolado quanto camundongos vivos. Norris destaca que “foi um projeto in vitro e in vivo, ambos mostrando o mesmo resultado”. Isso traz mais confiança nos resultados, já que confirmam a mesma coisa em culturas e em organismos vivos. O próximo passo da equipe é entender a razão pela qual esse complexo causa tantos problemas.
As implicações clínicas também são importantes, porque os resultados sugerem que até pequenas quantidades do complexo Aβ/fibrinogênio podem ativar características da doença de Alzheimer muito antes dos sintomas cognitivos aparecerem. Os camundongos expostos ao complexo, por exemplo, mostraram elevados níveis de fosfo-tau181, um biomarcador usado em humanos para detectar Alzheimer anos antes do surgimento dos sintomas. Isso levanta a possibilidade de que o estudo esteja replicando os estágios iniciais da progressão da doença e que intervenções precoces visando esse complexo possam atrasar ou até prevenir a doença.
Embora existam muitos mecanismos envolvidos na doença de Alzheimer, a equipe acredita que esse caminho específico merece mais atenção. Simões-Pires observa: “Não é uma doença simples. Muitos outros fatores podem causar neurotoxicidade, e não estamos dizendo que inibir a formação desse complexo curaria a doença. Porém, direcionar-se a esse complexo talvez alivie algumas patologias e seja ainda mais eficaz combinado com outras terapias.”
Essas descobertas aproximam os pesquisadores de entender como se espalham os danos no cérebro de quem tem Alzheimer e como barrar uma interação tóxica específica pode fazer a diferença.